Deborah Vier Fischer (*)
Quando a palavra nos visita de madrugada, encontrando a porta aberta, entra e se sente bem à vontade. […] Palavra viva. Viva a palavra. Um salve às visitas inesperadas.
Fátima Farias (**)
Texto que nasce tarde da noite, fruto da palavra ouvida, vivida, sentida durante o dia. Texto que acorda o corpo e o deixa trêmulo de ideias, vontades, imagens. Texto que ganha vida com as palavras de Sonia Rosa, proferidas nos encontros com as turmas da escola no período da manhã.
Uma coberta quentinha aquece as pernas. Os dedos das mãos, antes gelados do frio da madrugada outonal de Porto Alegre, são rapidamente aquecidos pelas palavras que nascem nos tlec tlec do teclado do computador.
Sonia Rosa me acordou esta noite. As palavras ditas por ela ressoavam em mim: alegria, amor, professora, olho no olho, herança da sua mãe, a paixão pela palavra dita, cantada, em forma de verso, prosa, provérbio…
E as perguntas das crianças… Como dormir com as perguntas na cabeça?
- O que tu ouves quando escreve, Sonia Rosa?
- Esse é mesmo o teu nome ou tu tens outro?
- O que tu sentes quando escreve livros? É difícil escrever?
- Por que tu dedicas teus livros a determinadas pessoas?
- E, falando nisso, por que teus livros têm nomes de pessoas?
Sonia, ao responder, calorosamente, cada pergunta, nos disse coisas do tipo:
Ouve jazz para escrever, uma música relaxante para as pessoas ficarem calmas e as ideias virem tranquilas. Sente muita felicidade em poder colocar as ideias no papel e criar as histórias e fica também muito feliz em ter tido uma mãe contadora de histórias. Está tão animada que começou a escrever outro livro. E é fácil escrever, o difícil é transformar a história em livro, mas é uma paixão.
Sobre seu nome? Na verdade, seu nome é bem longo, mas gosta muito de Sonia, que é o primeiro nome, e de Rosa, que é o nome das mulheres da família, a vó é Rosa, a mãe também, e são suas referências. Por isso, Sonia Rosa! E lá se vai aquele sorrisão da Sonia que deixa a gente completamente extasiada…
Sobre as pessoas citadas em seus livros, Sonia nos contou que elas fazem parte de uma rede de afetos, com pessoas de sua relação que, juntas, colocam o amor em ação. E em tempos de tanto desamor, tristeza, injustiça e notícias ruins, escrever, estar com as crianças e com quem ela conhece, deixa seu coração em festa e colabora para que esteja, mais do que nunca, intensificando o amor.
Ao ouvir essa fala da autora, uma menina do segundo ano lhe diz: “Sabe, Sonia, eu também sou assim. Quando estou entediada ou triste, escrevo. Já escrevi vários livros…”
Assim, nesse clima de conversa, de gente para gente, de olho no olho ou de tela para tela, independente de idade, Sonia afirmou, com alegria, que sim, a entendia. Que as palavras são um presente, elas podem ser doadas, elas trazem calor, pois nelas têm ou estão as pessoas.
Pronto! Acho que já posso voltar a dormir. As palavras fizeram a sua visita e aliviaram meu coração e meu corpo.
Boa noite, Sonia Rosa, amiga das palavras!
(*) Coordenadora Pedagógica da Projeto.
(**) Em Mel e Dendê, p. 5, POA: Ed. Libretos, 2020.