Rubem Penz
No transcurso do século 20, migramos rapidamente de famílias numerosas (onze, quinze filhos) para famílias médias (três, cinco filhos) até chegarmos ao que hoje predomina: filhos únicos ou, quem sabe, dois lindos rebentos. Esses tempos, conversando com uma amiga cujo terceiro bebê nasceu sem planejamento, cheguei a perguntar: como conseguem se virar? A resposta foi muito interessante. Ela afiançou estarem muito mais organizados e harmônicos do que antes. Como assim? Simples: é a ordem ou será o caos. Este é o poder que emana do grupo – ele cobra planejamento, compromisso, pontualidade.
Por falar em grupo, a ordem unida nos quartéis serve para mais do que promover desfiles bonitinhos no Sete de Setembro. Treina comando e espírito de corpo. Num deslocamento de tropa, os indivíduos são subordinados às ordens sob o risco de, ao estarem dispersos, morrerem já na primeira batalha. Uns aprendem a obedecer, outros a comandar (e ambas as faces são imprescindíveis). Quando uma força tarefa ajusta os relógios antes da missão também mira a capacidade de concatenar as ações subordinadas à estratégia. (Qualquer semelhança com nossa rotina ao sair e chegar em casa hoje em dia não é coincidência.) Repete-se na caserna, o tempo inteiro, a tríade planejamento, compromisso, pontualidade.
Esse papo de tropa nos leva para a sala de aula. Ah, como eu sonho com a chance de ver alguns pais experimentando a condução rotineira de atividades para quinze, vinte crianças de uma só vez. Mais: fazer isso tendo em vista objetivos pedagógicos de curto, médio e longo prazo para cumprir de modo tão coordenado quanto possível. Ainda mais: partindo de intrínsecas individualidades, as quais precisam ser respeitadas sob o risco de alguém ficar para trás, ou de lado, ou adiante, ou de fora, ou etc. Apenas quem provou tal desafio sabe o real valor de serem respeitados o planejamento, os compromissos e a pontualidade.
O que desemboca, enfim, nos idênticos desafios de todos os pais: sono, manha, trânsito, stress, compromissos, imprevistos, muitas vezes grandes distâncias a percorrer… Ninguém diz que é fácil deixar nossos filhos na porta da escola no horário marcado ou buscá-los sem atrasos. Não é mole não, mas é necessário. A tropinha precisa estar reunida para que a professora organize as tarefas, ou a estratégia será prejudicada. Se multiplicarmos por vinte horários de chegada diferentes, ao invés de existir um só para todos, é fácil vislumbrar o caos. Eis o valor do planejamento, do compromisso e da pontualidade.
Caso você, leitor, esteja no grupo que maldiz a correria das manhãs, ou reiteradamente permite que seu filho chegue fora de hora, uma lembrança: seus recentes antepassados coordenavam a rotina de adolescentes a bebês de fralda, todos ao mesmo tempo e na mesma casa. Sem luz elétrica, geladeira, automóvel. Sem micro-ondas! E todos comiam, vestiam, dormiam e sobreviveram para deixar herdeiros que, hoje, quem sabe, se queixam de barriga cheia.