Virgínia Veríssimo
Cada vez te ver
É mais te adivinhar
Doida pra crescer
E se aventurar
(Nei Lisboa)
Olhos arregalados, o coração aos pulos, quase na boca. É assim que ia para a escola pela primeira vez. Primeira vez que enfrentava a situação de forma consciente. Nem lembrava que havia entrado na escola com um ano de idade, quando a minha mãe resolveu que deveria voltar ao trabalho.
Ia para uma escola nova, acompanhada do pai que me segurava a mão com firmeza e me conduzia pelas calçadas do bairro, enquanto meu pensamento estava em outro lugar.
Conferia mentalmente a lista dos materiais que deveriam constar na mochila.
Podia sentir o cheiro das folhas novas do caderno, do livro que havia comprado há alguns dias na livraria. O giz-de-cera. A tinta têmpera. Cheiros que confortavam.
Vez ou outra sentia um enjôo no estômago que me trazia de volta para o mundo real. Nem quis almoçar naquele dia.
Como seria quando chegasse à sala de aula: os olhares das outras crianças? E se dissesse alguma bobagem e todos rissem? Se não soubesse a matéria? Se ninguém quisesse conversar ou brincar no recreio? E a professora, se fosse uma chata?
Pobre de mim, menininha, confusa em meus pensamentos.
Acabei de lembrar que havia deixado o lanche na mesa da cozinha. Logo aquele que a mãe tinha preparado com tanto empenho. E ela nem gostava tanto da cozinha.
Volto atrás, subo e desço escadas e encontro o pequeno embrulho acompanhado de um bilhete. Passo a mão rapidamente nos dois e caminho com passos rápidos e longos, acompanhando as pisadas de meu pai. Não queria atrasá-lo para o trabalho.
Chego à escola, despeço-me com um nó na garganta, sento em um canto, afastada de todos, belisco um pedacinho do bolo sem ninguém ver. O sabor sem igual. Mais um pedaço antes de ler o bilhete. Metade da fatia fica para o lanche.
O bilhete em letra manuscrita não passava de uma receita do bolo deixado pela minha mãe: uma gota de insegurança, três xícaras de alegria, uma pitada de ansiedade, uma dose de confiança, dez colheres de curiosidade e um copo de disposição. Todos os ingredientes combinados e misturados. Pronto, a receita perfeita.
Ouço chamarem meu nome. Agora só frio na barriga.