Rubem Penz
As meninas, hoje, são os novos meninos: fortes, competitivas, seguras. Não deixam nada barato, nunca se submetem, reagem.
Os meninos, hoje, são as novas meninas: delicados, cooperativos, maleáveis. Admitem suas falhas, relevam, escutam, não reagem.
O mais delicioso de começar uma crônica com simplificações é escutar o eclodir dos ovos das pulgas atrás de muitas orelhas. Porque ora se pensa: sim, é isso; ora: opa, claro que não, não é nada disso. Mas aquele primeiro concordar fica comichando a razão para, no mínimo, admitir-se que nada é (ou nunca mais será) simples como antes foi (e não acho que tivesse sido, apenas os papéis de gênero, determinados e fixos, embalavam o pacote de comportamentos feminino e masculino).
Falemos do passado: o “pacote menino” e o “pacote menina” cobriam prováveis semelhanças compondo figuras típicas de diferença (em rosa e azul). Sufocava personalidades, determinando o valor de estima. As características outrora tidas como preponderantes de meninos (segurança, força, liderança), ou na expectativa que se costumava ter sobre eles, eram todas percebidas como positivas. Enquanto isso, aquelas características projetadas para meninas pareciam depreciativas (delicadeza, submissão, cordialidade).
Pulemos para hoje: para inverter a lógica ultrapassada, despidos do embrulho démodé (ao adotar, digamos, tons de verde), masculinizar-se tornou-se um ganho, afeminar-se uma perda. Um lado (o das meninas) se movimenta na direção da conquista, outro (o dos meninos) cede território. Neste embalar das coisas, parece bem mais fácil desejar que sua filha seja feminista do que neutralizar o machismo no filho. Parece, não: ouso afirmar que é. Portanto, urge desprezar a padronização – seja ela a antiga, seja a (vá lá) nova.
A sala de aula, especialmente nas séries iniciais, pode vir a ser muito útil neste novo arquétipo. Um caminho seria o de igualar méritos em atividades que demandem tanto força quanto delicadeza, tanto superação quanto cooperação, tanto firmeza quanto negociação. Reconhecer que personalidade dominante não masculiniza uma moça: ela pode ser menina e severa ao mesmo tempo; menina e hábil; menina e líder. Também o menino poderá ser um cuidador natural. Que a docilidade seja coisa de homem; a fragilidade seja coisa de homem; a modéstia (olha a dificuldade em escrever submissão) seja coisa de homem. Ninguém perde quando autêntico, todos ganham quando aprimoram habilidades. O que se espera de professores é jamais deixar que os traços de individualidade sejam confundidos com expectativa de gênero.
Má notícia: tudo isso poderá parecer esforço inútil na puberdade. A testosterona virá com força e a tendência será a de atropelar uma igualdade harmoniosa entre os sexos. Mas eu acredito que muitas (boas) sementes já terão sido lançadas. Será quando um rapaz, por exemplo, venha a ter orgulho em conquistar o coração de uma moça pelo estômago (ao molde das gerações de suas avós), e ninguém estranhará – nem ela, nem os pais, nem os amigos. Um talento surgido na pré-escola, quando brincava de cozinhar sem ser vítima de preconceito, de chacota.
Enfim, o melhor presente poderá vir embalado com afeto, tolerância, transparência.
Sim! Podemos até nem lembrar depois de crescidos, mas sementes poderosas em nossas vidas são plantadas lá cedo, na prineira infância. Sem isso, a nós, pais de adolescentes, só nos restaria…sentar e rezar!!!!