Leila Rechenberg (*)
Hoje, neste momento tão especial, nós, pais desta turma de formandos, preparamos com muito carinho uma pequena homenagem a essa escola do coração. Durante os últimos meses, vivemos com as crianças a elaboração da despedida desse espaço seguro, amoroso e criativo. Demoramos a nos organizar para este momento: só no início de novembro começamos a agir. Não por acaso… afinal, negar um pouco o sofrimento é até bem saudável! Mas logo tratamos de transformar essa dorzinha da saída em palavras, em lembranças, em uma costura que seguirá nos deixando unidos de alguma forma. Assim como em Frankstein, aprendemos que partes de diferentes vidas podem formar uma vida nova, cheia de subjetividade e significados. E como uma costura de palavras, da memória das crianças e das nossas, vamos contar um pouco desses anos que passaram aqui.
Primeiro dia de aula. Frio na barriga. Novos amigos. Será que são legais? Vão gostar de mim? Turma. Uniforme. Mochila nova. Cadernão. Descobertas. Escrita. Livros…muitos livros! Lá vem história outra vez com Heloisa Prieto. Um acordeon com Borguetinho. Bienal. Pátio grande. Queimada. Balanço. Caixa de areia. Recreios muito esperados. E a Bolsa Amarela para os dias difíceis.
Crescem um pouco. Surgem as assembleias e grupos áulicos. Aprendem a fazer escolhas. Trabalhar com o amigo. Ajudar um colega. Aprender com outro. Ana Maria Machado e o Raul da Ferrugem Azul os ajudam a compreender que todos os sentimentos são importantes. Sempre. Assim como grandes escritoras, grandes artistas povoam o cotidiano. Chapéus ousados. Cadeiras muito malucas. Tapeçaria. Xilografia. Muitos caminhos possíveis com a Zoravia. Outros tantos com Antônio Villeroy, suas histórias e músicas, do Rio de Janeiro para o Rio Grande. E vice versa.
O pátio ainda era grande. Já alcançavam a corda bamba. Alcançavam também outras cidades. Cartas iam e vinham de outros lugares, de outras escolas, de outras crianças. O mundo é grande e pequeno. Teresa Poester e Daniel Munduruku, trazem a natureza e as histórias de outros povos. O mundo é mesmo pequeno e somos todos parecidos. Monica Tomasi mostra que o samba e o rock também são coisas de menina.
Volta às aulas. Expectativa. Mudança de turno. Acordar cedo. Mudança de turma. Desacomodar. Fazer novos laços. Preparar o futuro. Ano de viajar sozinho. De partir pro litoral sem pai nem mãe. De ver o horizonte no mar. Desse mar de onde também veio a Xica, pela escrita da Rosinha. Com Mauro Fuke percebem a engrenagem e sincronia da madeira e outros elementos. Sincronia, natureza, tempo. Edward Toulaine ajuda a aceitar as partidas, as perdas e as voltas que o mundo dá. A gente confia que a vida é boa! De repente, acordam sonhando, junto com o Vitor Ramil! Todos num só tom. Cada dia mais afinados. Cada dia mais unidos. Voz. Instrumentos. Show num palco gigante. Mãos dadas. Confiança. Sintonia.
O pátio vai ficando pequeno. A sala de aula também vai encolhendo. As pinceladas delicadas da Lucia Hiratsuka contagiam a todos. Imagens e palavras andando juntinhas, quase dançam! Chega o frio e viajam para mais longe com Sepé Tiaraju. Viajar sem pai nem mãe já não causa mais medo. Na volta, assistem a guerra pelos olhos de um cavalo. Sim. O mundo pede diversos olhares. O Yanto Laitano mostra que ninguém precisa parar de se divertir e brincar quando cresce! Que alívio! Mas a gente precisa mesmo sair dessa escola? Colocam o medo do que vem por aí em monstrengos pintados na parede. Também nas leituras de horror. E, com tudo isso, podem começar novos alinhavos e preparar a costura do futuro com a ajuda da Ana Flávia Baldisserotto.
Agora, loucos pela vitamina F de férias. Preparam a saída. A formatura. A mudança de escola. A despedida. Da saudade virá o reencontro. Da memória amorosa, virá a Projeto, agora como um lugar pra sempre, casa.
Gratidão, gratidão, gratidão! É esse o sentimento que partilhamos hoje com vocês todos, cada um de vocês fazendo parte dessa linda construção. Gratidão por essa maravilhosa equipe, que nos ajudou a chegar e agora nos ajuda a partir!
Com essas memórias vivas as crianças construíram esse “pequeno” presente para a escola. Uma camiseta “Frankstein”, onde o feio pode ser belo e cheio de sentido. Exploramos memórias, lembranças de diferentes momentos que viveram aqui, para que, ao final, elegessem uma palavra que pudessem deixar! E, com essa costura de palavras, formamos esse uniforme coletivo!
Estão prontos para o mundo!
Obrigada Escola Projeto!
(*) Mãe do João Pedro e do Guilherme.