Deborah Vier Fischer (1)
Então, 2020 se foi. Um ano letivo tão sonhado, tão planejado. Um ano especialmente esperado para tantas pessoas, adultos e crianças. Não que outros anos não fossem, mas a cada novo ano, a cada montagem do nosso calendário escolar, é como que se uma forte chama reacendesse dentro de cada um(a) de nós, com as esperanças renovadas de mais um ano intenso e sempre diferente.
E o ano de 2020 cumpriu com todas as expectativas de um ano diferente! Em todos os sentidos. Nossas previsões, planejamentos, nossas certezas, nossos tempos, tudo foi colocado à prova. Um ano escolar que passou sem ser o mesmo daquele que foi projetado quando do seu início. Quem sabe, com inspiração no vídeo a que assistimos, Desmáquina (2), de Elida Tessler, tivemos um “desano”. Um desano, mas jamais um desânimo, como diz a própria artista, quando em conversa sobre o quanto o desmontar e o desfazer podem nos mostrar as coisas que estão ali, mas a gente nem sempre consegue ver. Um desencaixe de objetos – e de sonhos, previsões, certezas – para que novos encaixes, novas montagens, outras construções se tornem possíveis. Falando nesse ano e em tudo o que ele mobilizou em cada um(a) de nós, essa ideia parece caber muito bem! Partimos de um todo, completo, montado, tornado ano em 200 dias letivos e, estando por dentro dele, sem poder viver no modo seguro e planejado inicialmente, precisamos lançar mão de cada peça e de cada engrenagem que faz a escola acontecer, para, desmontando-a, poder remontá-la em outro modo, remoto, virtual, não presencial, ou como mais quisermos chamar.
Um desano, literalmente, para todos e todas. Não houve área ou profissão, não houve vida que não tenha sido afetada por ele. O tempo passou a ser matéria de trabalho. O instante, a nossa maior certeza. Foi nessa perspectiva, do hoje, que cada momento da escola foi ganhando corpo e acontecendo. Juntos(as), no Zoom, as atividades escolares foram vividas em força, coletividade e intensidade. Ganharam formas variadas. Desse modo, mantivemos as viagens de estudo: fomos de “Expresso Google” às Missões com o 5º ano e ao litoral com o 4º ano. Tivemos mostras de teatro com todas as turmas do fundamental, aulas abertas de Ciências, muitos convidados e convidadas, inclusive de outras cidades e estados, estiveram conosco nesse desano e aprendemos tanto! Tivemos Grêmio Estudantil atuante, tivemos estudos potencializados pela presença das famílias, que trouxeram contribuições importantes, afinal estavam no dentro da escola, no desmanche daquele modelo que se tornou antigo de uma hora para outra. Tivemos reuniões, muitas reuniões! Estivemos tão juntos(as)!
Tivemos os sábados letivos, os estudos do autor Caio Riter, do músico Mario Falcão e da artista visual Elida Tessler. Não tivemos a Feira do Livro da escola, é verdade, mas houve a presença forte do Caio em todas as turmas, através dos seus livros e dele próprio nos encontros virtuais. O show do músico aconteceu, pelo Youtube e pelo Zoom, e foi emocionante! No dia 5 de dezembro, tivemos a nossa Mostra de Artes Visuais (ou seria, Virtuais?), para algumas turmas da Educação Infantil e do Ensino Fundamental. Com Elida Tessler entrando na casa de cada criança e de sua família e com as casas transformadas em espaço de arte, com as produções dos alunos e alunas expostas no seu local de estudo, na sua escola do desano, tivemos a oportunidade de nos emocionarmos diversas vezes, e de fazermos uma composição, com palavras e sonoridades, que serão juntadas e tornadas produção coletiva: a nossa obra com Elida Tessler! No sábado seguinte, dia 12, contamos com mais Elida, dessa vez para as turmas do Grupo 5 ao 3º ano. E mais Mostra de Artes (Virtuais) para nos alimentar e para que pudéssemos encaixar mais uma pecinha nesta escola inventada, (re)criada, renovada e sempre viva! Uma escola que se forma em um ano desforme, mas que jamais deixa de desejar e de acreditar, e que vai compondo um novo desenho de lugar de aprender, uma nova narrativa, construída coletivamente, assim como a máquina de escrever do pai da Elida que, ao ser desmontada, faz nascer, com suas peças, uma carta, a “Carta ao Pai”, em referência à obra de mesmo nome, cujo vídeo Desmáquina mostra o passo a passo desse processo. Vi a escola Projeto aí, de alguma forma. Que imagens poderíamos construir ou que cartas poderíamos inventar que narrassem a Projeto em seu desano? Fica o convite e o desafio!
Felizes férias!
(1) Coordenadora geral e de 4º e 5º anos da Escola Projeto.
(2) Vídeo que mostra o processo de desenvolvimento da obra Carta ao Pai, exposta na Galeria Bolsa de Arte, em 2015, e que fez parte da exposição “365”.