Deborah Vier Fischer (*)
Este texto tem data de início. Não tem, no entanto, até o momento, data de fim. É uma homenagem que faço, como coordenadora da Escola Projeto, à equipe pedagógica, pela sua garra, vontade e força diante dos novos desafios.
Vivemos momentos de tensão, tem-se falado tanto nisso! Momentos em que enfrentamos, de fato, o não saber. Momentos em que a inventividade e a colaboração têm sido as nossas melhores companhias.
De um dia para o outro, nosso acesso à escola, esse espaço que nos acolhe durante tantos dias e tantas horas ao longo de um ano letivo inteiro, mais especificamente 200 dias letivos e 800 horas, nos foi negado. Um vírus nos fez parar. Lembro como se estivesse vivendo isso agora, enquanto escrevo, do semblante de cada professor, cada professora e dos demais profissionais da escola, no momento em que recebiam a notícia de que iríamos fechar as portas, a princípio, até o final de março. E março passou, e abril está chegando ao seu final, e…
Era março ainda, mais especificamente, dia 23, quando, em conversa com a direção, definimos a necessidade de buscar junto à equipe do fundamental, um outro modo de trabalho, mais interessante, dinâmico, diferente talvez, para que as crianças mantivessem o contato com a escola, de algum modo, e também com as aprendizagens. As primeiras propostas, até aquele momento, vinham sendo realizadas através de postagens no nosso site e as chamamos, depois, de “primeira etapa da quarentena”. A segunda etapa, inicia, então, no dia 1º de abril, quando passamos a fazer uso de uma Plataforma Educativa. E é sobre esse segundo momento que quero me debruçar especialmente nesta escrita.
Por quê? Porque foram e têm sido dias muito intensos! Dias de muitas descobertas, dias de alegrias pelos desafios vencidos, dias de tensão, diante das tantas coisas que nunca tínhamos vivido, dias de choro, por vezes, pelo cansaço das horas trabalhadas, dos pensamentos, das cobranças, que, muitas vezes, vêm de fora e outras, de dentro de cada um(a) de nós, acostumados(as) a nos desafiarmos nessa grande jornada, que é a educação.
Mesmo nos momentos de alegria e de risadas gostosas tivemos as nossas atrapalhações em testar salas de aula virtuais e espaços para as nossas reuniões à distância, que, inicialmente, foram diárias, quando não aconteceram mais de uma vez por dia. O aviso de reunião era disparado em grupos de WhatsApp, por cada coordenadora à sua equipe. E começavam, então, as confusões. Dificilmente as reuniões iniciavam no horário previsto. Uma professora não conseguia se conectar, a outra não achava o microfone, e tinha, ainda, as que estavam perdidas em alguma outra sala virtual, das diversas testadas anteriormente pela gente. Engraçadíssima a situação! Lembro do dia em que, algumas horas depois de encerrada uma reunião geral de equipe – com infantil e fundamental, professoras regentes e de área -, já num segundo encontro que havíamos combinado, dessa vez somente com as regentes do fundamental, qual não foi a nossa surpresa quando, ao entrarmos na sala, vimos que alguns colegas não tinham saído ainda da reunião anterior, mantendo-se conectados! As reuniões iniciavam sempre de modo muito divertido… e demorado! Havia um clima de curiosidade, misturado com preocupação, mas, acima de tudo, havia algo que considero o mais importante: parceria e cuidado com o outro.
E as salas de aula então? Combinamos, desde o início, que faríamos parcerias nas salas virtuais, de modo que cada professora tivesse sua professora auxiliar, uma companhia para estar próxima e para ajudar no que fosse necessário. Afinal, o trabalho estava sendo construído de maneira coletiva, então, o olhar do outro, certamente, seria no sentido de contribuir. Também a equipe de área passou a fazer parte de cada sala de aula. Uma sala de aula com muitas pessoas fazendo postagens pode ser algo muito lindo, mas pode também gerar algumas confusões. E elas não demoraram a chegar.
– Gente! O que aconteceu na sala de aula? Onde estão as postagens que eu fiz ontem? – Perguntava Caliana.
– Ué? Eu postei uma atividade de proparoxítonas e agora ela está no nome do Márcio, professor de Educação Física! Alguém me ajuda? – Pedia Carol.
– Débora, socorro! As famílias não estão conseguindo baixar as atividades! Faz um tutorial? E em minutos o tutorial estava postado na sala.
– Gurias, a minha sala está uma bagunça, quem me ajuda a arrumar? – Compartilhou Graça.
– Deborah, tem uma postagem tua solta na sala. Fiz um “videozinho” para veres como postar nas atividades – Ajudava Vanessa.
Diante dessas e de tantas outras situações, achamos que era hora de nos tornarmos mais fortes como equipe, já que o trabalho precisava dos novos saberes de cada um(a) de nós para acontecer. Criamos, então, nossos avatares! Mais um momento bonito desse trabalho, em que nos divertimos, buscando meios de ficarmos mais parecidos com o modo como estávamos nos vendo/sentindo naquele momento. E muitos outros avatares foram criados depois disso…
Assim, estamos há quase um mês compartilhando, diariamente, as dores e as delícias de um trabalho que não pode ser chamado de EAD (educação a distância), pois não usamos ferramentas e metodologias para esse tipo de trabalho, nem temos uma formação específica para isso. Também tenho dúvidas se podemos falar em ensino remoto. Acho que não. Atividades domiciliares, como referido junto aos sindicatos e pareceres legais, também me parece não ser bem o que tem sido feito. Há muitos fatores envolvidos neste momento e nessa modalidade de trabalho. Há muitas vidas, que, mesmo longe, estão perto. Há muito ainda por descobrir, inventar, desenhar, em tempos de Coronavírus. Então, prefiro apenas chamar o que temos feito de “Encontros possíveis para pensar e aprender de outros jeitos”. E isso envolve todos(as) nós, crianças, famílias e escola. E envolve momentos lindos, de descobertas e alegrias, e também momentos tristes, em que o desânimo e o cansaço fazem com que percamos o sono e tenhamos que conversar, por vezes de madrugada, a fim de recuperar o ar que parece encurtar. Por sorte, temos uns aos outros e isso diz muito sobre-viver.
(*) Coordenadora geral e de 4º e 5º anos da escola.