Neca Baldi (*)
Cheila Schroer (**)
Nossas escolas estão fechadas há dois meses e meio e ainda não sabemos ao certo sobre quando serão possíveis a reabertura de suas portas e o retorno das crianças.
A Covid-19, que nos colocou dentro de casa (e somos privilegiados(as) por termos casa!), trouxe com ela o inusitado, a insegurança e a fragilidade para todas as gentes e para qualquer tipo de atividade. O momento tem exigido reflexão e busca de alternativas para seguirmos e nos reinventarmos.
Neste texto abordamos o setor administrativo-financeiro da escola, que usualmente fica por trás do pedagógico, nos bastidores, por assim dizer, mas não é menos importante porque, de fato, o viabiliza e o possibilita acontecer. Entendemos, na verdade, que eles devem andar juntos, próximos e sintonizados para a escola funcionar bem. Cada um desses setores tem suas próprias e variadas demandas acontecendo sistematicamente, mas a balança, conforme a circunstância, pode pesar mais para um lado ou para outro, em relação ao tanto que nos exigem a cada momento. Na situação atual, por exemplo, as questões pedagógicas exigiram e continuam exigindo grande atenção e esforço coletivo, no sentido da construção de melhores alternativas de interação e aprendizado, através de atividades remotas para crianças tão pequenas como as nossas. Mas são, acima de tudo, as questões administrativo-financeiras que nos têm tirado o sono. E é por isso que precisamos falar aqui e agora sobre elas, compartilhando com quem nos lê a pergunta que não quer calar: como manter nossas escolas, cumprindo com todos os seus compromissos financeiros nestes tempos de pandemia, em que começamos a conviver com a evasão (especialmente dos pequenos, da educação infantil) e a inadimplência? Como seguir ofertando uma educação de qualidade e diferenciada, sem a necessária viabilização financeira?
Para que consigamos manter nossas instituições e seus projetos político-pedagógicos – e aqui falamos em escolas privadas sem mantenedoras, sem incentivos e não filantrópicas, como a PROJETO e o CID, que são vizinhas de bairro, inclusive -, precisamos de uma gestão financeiro-administrativa saudável e austera. E é o recurso financeiro que nos chega pelas mensalidades que garante a concretização do plano de gestão e a manutenção das pessoas, profissionais em nível de excelência, que temos conosco nas equipes pedagógicas.
Pensando nisso, nos perguntamos: de que maneira, diante de uma crise sem precedentes como esta, nossas escolas poderão competir com as escolas de rede, muitas delas religiosas e filantrópicas, que possuem subsídios e/ou que têm isenção de impostos? Elas, com certeza, podem dar bons descontos para as famílias, como vem acontecendo, segundo mostra a reportagem a seguir, veiculada no jornal Zero Hora, do dia 8 de maio de 2020:
Ocorre que ficamos sem ar, para dizer o mínimo. Estamos inquietas, indignadas e assustadas porque, de fato, navegamos em embarcações diferentes e em uma condição desigual. Não temos representatividade e/ou apoio de órgãos superiores. Não nos sentimos acolhidas por eles, pois temos necessidades e urgências muito diferentes. Essa situação diferenciada torna a “concorrência” desleal, e tudo fica mais difícil e delicado. Não podemos e nem queremos ser comparadas com essas grandes instituições. Temos respeito por elas, mas não somos como elas. Temos a nossa própria concepção de educação, nossos valores e nossa história. Temos uma gestão enxuta, sem respaldo de mantenedora. No entanto, as cobranças nos chegam e não poderemos ofertar descontos como os citados na matéria, sob pena de inviabilizarmos nossas instituições e nossos compromissos que, diga-se de passagem, não são poucos. O “rombo“ já está instalado e sabemos não ser um privilégio nosso.
Então, é preciso esclarecer: não dar descontos significativos ou não corresponder ao que algumas famílias esperam nesse sentido não quer dizer que ignoramos que muitas delas foram afetadas economicamente pelo vírus. Estamos, sim, vivendo e administrando a inadimplência, a evasão e as necessidades que geram ajustes individuais. Essa é a única forma de sobrevivermos a este momento, pois os valores das mensalidades não pagas ou subtraídas nos afetam e afetarão direta e fortemente a continuidade de nosso trabalho.
Somente para terem uma ideia, tivemos de recorrer no mês passado (e neste próximo também será necessário) ao financiamento, disponibilizado a juros mais baixos e a prazo mais largo pelo governo, para garantia da folha de pagamento e estabilidade dos(as) funcionários(as). Também suspendemos o recolhimento do FGTS e o pagamento da DAS (Documento de Arrecadação do Simples Nacional), assim como antecipamos férias de algumas funcionárias da limpeza e da secretaria, para garantia da equipe completa logo mais adiante. Enfim, temos encaminhado tudo que é possível, a fim de minimizarmos os estragos causados pela pandemia, pelo menos até o momento. A conta disso tudo virá depois. De qualquer forma, esses artifícios se fizeram necessários para a manutenção de nossas escolas. Não estamos reclamando, apenas lamentando (especialmente as evasões) e dividindo com quem nos lê a nossa realidade.
Ainda assim, com todas as dificuldades e para além das negociações individuais, a Projeto conseguiu repassar um desconto de 6.2%, tendo em vista demandas das famílias e a redução momentânea de alguns custos. Porém, no retorno – é importante também que se diga -, teremos custos adicionais com as compensações de aula e os gastos extras de água, luz, portaria, passagens etc., sem falar naqueles relativos ao cumprimento dos protocolos para reabertura das escolas, que envolvem garantia de higienização especial, regras de distanciamento e aquisição de EPIS para segurança de todos(as), os quais não poderão ser repassados às famílias.
E, enquanto o tempo de isolamento segue, a equipe pedagógica continua super envolvida, atenta, trabalhando e propondo atividades domiciliares, tanto para o ensino fundamental, como para as crianças da educação infantil, como não poderia deixar de ser. Sabemos que a interação presencial é que dá sentido à experiência escolar e faz toda a diferença, especialmente na idade de nossos alunos(as), o que implica em que para algumas crianças esse trabalho tenha mais o propósito de manter alguma ligação da escola com elas e suas famílias, do que garantir determinados aprendizados específicos do currículo escolar. Mas isso não invalida todo esse esforço, que é também de cada família que se envolve e participa das propostas para que elas, de fato, se concretizem (sem os/as adultos/as de casa, as atividades realmente não teriam como acontecer). Chamamos a atenção, no entanto, para as tantas outras e importantes aprendizagens que estão sendo realizadas neste longo período de distanciamento, por todos e todas, adultos e crianças.
Intencionamos seguir em frente e enfrentando, com todas as nossas forças, as dificuldades que se apresentarem, cada uma a seu tempo, mas entendemos ser muito oportuno e necessário este esclarecimento à nossa comunidade escolar. Buscamos trazer elementos para que vocês entendam melhor a situação em que nos encontramos, percebam como não se pode comparar o incomparável e, dentro do possível, continuem apoiando a sua escola. Essa parceria é vital e, somente ela, nos fortalecerá e nos ajudará a enfrentar o que vivemos hoje.
(*) Diretora da Escola Projeto.
(**) Diretora do CID – Centro Integrado de Desenvolvimento.